sexta-feira, 19 de setembro de 2003

OS MALEFÍCIOS DO TABACO.
Se bem se lembram do original de Anton Tchekov, um personagem ia perorando sobre as misérias da vida a pretexto de uma conferência sobre os malefícios do tabaco.
Este texto inspirou-me de uma forma verticalmente oposta, ou seja, a propósito das misérias da vida decidi perorar sobre os malefícios do tabaco. Um pouco "fundamentalista", não é?
Fumei mais ou menos durante 45 anos, sempre convicto, inveterado e por vezes furioso.
Após vários períodos de mal-estar, tal como cansaço exagerado, tosse convulsiva, sono inquieto e sucessivas e preocupantes faltas de ar, achei que estava na altura de parar.
Estava avisado das qualidades aditivas da nicotina, da forma insidiosa como os neuro-transmissores nos tentavam enganar ao primeiro esboço de vontade própria, de modo que decidi não arriscar e procurei na medicina uma ajuda especializada.
A verdade é que resultou!
Deixei de fumar e neste momento, segundo a minha simpática médica, sou considerado clínicamente um não-fumador. Em boa verdade devo acrescentar que me custou muito menos do que eu achava possível, no entanto há aspectos que convém resalvar.
Em primeiro lugar há que referir que ganhei uma "senhora" barriga, que me era totalmente estranha e que ainda hoje me incomoda bastante, concretamente de manhã, quando pretendo amarrar os atacadores dos sapatos. Fora isso, as coisas melhoraram: Passei a dormir, e a deixar dormir, deixei de ter a terrível tosse que me assombrava as madrugadas, deixei de ser uma pessoa permanente ofegante, etc....
Uma das coisas que mais me confundiu, foi o conceito que o Poder tem sobre a noção de vício. É certo que me deram consultas gratuítas no Hospital de Santa Maria, mas quando fui comprar os adesivos "nicotinados" que me iam ajudar a controlar o vício, fui confrontado com embalagens de 28 unidades (1 por dia), a cerca de 12 contos cada caixa, sem comparticipação.
Ora bem, durante 45 anos contribuí indirectamente, de forma substancial para os cofres do Estado, que ao que parece arrecada mais de 50% em cada cigarrinho consumido cá na terrinha. Na hora do retorno: Népia! Ao que parece, faz fé a máxima de quem não tem dinheiro, não tem vícios! Fosse eu um agarrado ao "pó", a assaltar velhinhas de esticão e a gamar auto-rádios, sem nunca ter contribuído com um "tuste" para o Tesouro, aí já era um doente, com direito à minha metadona à borla e um tratamento de comiseração e compreensão que como fumador nunca tive.
De facto, um fumador é um viciado! Tem de pagar pelos vícios, para se livrar deles e ainda por cima é mal tratado na praça pública. Já o "agarrado" é um doente, sujeito à maior das compreensões e dos cuidados.
Cá para mim está tudo maluco!
Em relação à nova lei que obriga a mensagens de choque nos maços de tabaco, em verdade vos digo: Fumar faz mal à saúde, é certo, muito mal mesmo, mas lá causar a impotência e a diminuição da quantidade de esparmatozoides, como vem anunciado, já tenho grandes dúvidas: É que na altura em que mais fumava fiz quatro filhas de seguida enquanto o diabo esfrega um olho e não senti qualquer dificuldade na execução da tarefa.

Diário de Bordo da Nave Espacial "Terra" - Tempo Estelar da Nova Era - 19 de Setembro de 2003

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