O Fonseca
já não via o Antunes há uns bons anos.
Desde
os tempos de colégio, nos quais partilhara a sua carteira com ele, as suas
vidas divergiram, e só de tempos a tempos, em notícias de jornal ou pela boca
de velhos conhecidos comuns, se foi dando conta de que o Antunes tinha subido
na vida e se instalara no topo da pirâmide social. Em suma: O Antunes fizera
fortuna!
Assim,
quando se dirigia para o edifício do velho Colégio, no qual se organizara um
encontro dos alunos do seu curso, perguntou-se se o Antunes lá estaria. Teria
descido à plebe, com o objectivo de resgatar velhas memórias dos tempos do
idealismo e da inocência?
Pois
bem, logo que franqueou a porta, o Antunes dirigiu-se a ele, de braços abertos
e estreitou-o num estranho, mas efusivo e forte amplexo.
“Fonseca!
Há quantos anos companheiro? Não imaginas as vezes que tenho pensado em ti...
que é feito de ti, rapaz? “. Um pouco desconcertado, Fonseca, a quem a vida não
tinha corrido de feição, retribuiu o cumprimento e balbuciou um clássico e
muito Português“...lá vou andando...”
Trocaram-se
mais alguns cumprimentos de circunstância, e como a cerimónia estava chata e a
hora do jantar se aproximava, o Antunes alvitrou que fossem os dois jantar para
“pôr a conversa em dia”. Um pouco atrapalhado e pensando na escassez do seu
saldo bancário, o Fonseca sugeriu, meio envergonhado, que só se pagassem a
conta a meias, ao que o Antunes logo acedeu, dando-lhe uma palmada nas costas. “Tal
como nos velhos tempos, não é Fonseca?” E lá partiram os dois em direcção à
baixa em busca de um restaurante.
O
bulício da rua, a vozearia geral, as gargalhadas dispersas, e aqui ou ali, a
buzina de um carro, quase causavam tonturas ao pobre do Fonseca, que dava
tratos à cabeça para se lembrar de um restaurante digno, mas que não fosse
muito caro.
Afinal,
ele um pelintra, com um emprego de que não gostava, mal pago e precário, estava
ali para jantar com o seu amigo que entretanto se tornara milionário. E se
acaso o Antunes lhe arranjasse um trabalho? Poderia ele sugerir isso de forma
pouco ostensiva? Seria que ele o ajudaria? Bem podia, caramba...
De
repente viu um restaurante que conhecia, que era razoável e acessível, ao qual
ele de vez enquanto levava a jantar uma das suas sucessivas namoradas. Agarrou
o braço do Antunes e sugeriu: “Olha lá, vamos aqui a este. Eu conheço o pessoal.
Eles são sempre muito simpáticos e...” O
Antunes olhou para dentro do restaurante, torceu o nariz e retorquiu: “Eh pá,
aqui a comida não presta, vamos antes aquela marisqueira ali à frente.” E a
passos largos dirigiu-se para uma marisqueira que exibia na montra uns aquários
com os mais diversos crustáceos. O Fonseca titubeou qualquer coisa, tomado de
aflição, mas não teve outro remédio senão seguir o outro.
Já
sentados à mesa, o Fonseca olhou para a ementa e os seus olhos pregaram-se na
coluna da direita, não querendo sequer saber quais os pratos disponíveis.
Quando
o criado se aproximou, cumprimentou o Antunes com alguma familiariedade e
perguntou ao Fonseca: “Que vai querer o senhor?...” O Fonseca com uma voz meio
sumida respondeu: “Olhe... traga-me um bitoque e uma imperial.” O Antunes, sem
levantar os olhos da lista pediu: “Olhe, para mim é uma lagosta à Thermidor e
uma garrafa de Vinho Verde Alvarinho muito fresca.” Pousou a ementa, olhou o
Fonseca nos olhos e perguntou-lhe: “Finalmente, explica-me lá o que tens andado
a fazer estes anos todos?” Com a voz sumida, e pensando já no cheque sem
cobertura que iria ter de passar para pagar a metade do jantar, respondeu: “Ora,
nada de especial... sabes como é? Trabalho, umas festas, umas miúdas de vez em
quando, enfim... tu sabes, o costume!” e com uma certa melancolia apercebeu-se naquele
momento de que nada na sua vida iria mudar.
É
uma historieta que me apeteceu escrever, e que teve basicamente como modelo
inspirador o que aconteceu a Portugal quando decidiu aderir ao Euro. Uma fábula
que de algum modo pretende ilustrar a imprudência política e o desastre
económico que foi a entrada de Portugal na moeda única Europeia.
Pouca
cautela, ambição e no fundo querer fazer-se passar pelo que não era e assim,
como o “Fonseca”, estamos a pagar metade de um jantar, pantagruélico para alguns,
mas muito modesto para outros.
Ao
abdicarmos da nossa moeda e aderirmos a um espaço monetário que enquadrava
moedas fortes, como o Marco, o Florim e
até o Franco, ajudámos, juntamente com outras economias fracas, a manter o Euro
com um câmbio baixo, potenciando e ajudando as exportações das economias
ricas, enquanto nós, sem competitividade e afogados em dívidas, não temos
qualquer instrumento para relançar a nossa economia.
Se
neste momento a Alemanha, por exemplo, tivesse moeda própria, com o dinamismo
da sua economia e os superavits comerciais que possui, o Marco estaria muito
mais valorizado do que o Euro, e aí pergunto-me a quem venderiam eles os seus Mercedes,
Audis’s e BMW’s.
Perante
esta perspectiva, só um tonto ou um ingénuo pode sonhar com a solidariedade
Alemã, e consequentemente da UE, pois
isso seria totalmente contra os interesses das mais dinâmicas economias
Europeias. Quanto mais economias na Europa estejam em dificuldades, mais
competitivo fica o Euro para os Países do Norte, e assim permaneceremos,
agrilhoados a esta moeda maldita, não para nosso interesse, mas para interesse
dos outros.
Quanto
a nós, os pelintras, temos de agradecer a Mário Soares e a Cavaco Silva a
imprudência de terem ido jantar com o “Antunes” Europeu, que é como quem diz,
com quem beneficia muito mais do que nós com a actual situação.
Por
esta razão é necessário que Portugal se mentalize que se quer continuar a ser
um País soberano, É URGENTE SAÍR DO
EURO!
Sem comentários:
Enviar um comentário