Enquanto
Pessoa afirmava que “a minha Pátria é a Lingua Portuguesa”, Eça aconselhava a
que se devia “falar patrióticamente mal as linguas estrangeiras”.
Em ambos os casos, estes “monstros sagrados” da nossa literatura denotavam a
sua preocupação com o principal factor da nossa identidade cultural e
histórica, marca indelével do nosso deambular oceânico, que disseminou a lingua
pelas sete partidas do mundo.
É claro que uma lingua viva não é estática. A sua grafia evolui, as gírias e
calões oriundos das várias sociedades de falantes, são adoptados mutúamente e
assim se compreende que não escrevamos ou falemos hoje como se escrevia ou
falava na idade média. No entanto estou em crer que essa evolução se foi
fazendo de forma lenta e gradual, co-existindo as mais das vezes o mesmo
vocábulo com grafias diferentes durante largos períodos de tempo, sem que daí
viesse mal ao mundo. Ainda me lembro bem da minha Avó escrever “pharmácia”, e a
senhora poderia ser tudo, menos iletrada!
Bem sei que as modernas necessidades de escolaridade obrigam a padrões
uniformizados que permitam alguma coerência no ensino, mas isto não invalidaria
a possibilidade de utilização de grafias, que embora diferentes, estivessem
ambas correctas. O tempo, esse magnífico mestre, se encarregaria de seleccionar
a que mais se adequasse, desaparecendo a outra ou outras, que por inanição e
falta de uso, sem sobresaltos ou polémicas, seriam erradicadas com naturalidade
da nossa lingua.
Na realidade não entendo a necessidade de um acordo ortográfico, principalmente
quando este não é aceite pela unanimidade dos seus falantes. Que raio de acordo
é este, que em oito países de Lingua Oficial Portuguesa, apenas é ratificado
por três?
Os Espanhois, que tanto gostamos de citar, não têm nenhum acordo ortográfico e
isso em nada diminuiu a importancia da Lingua Castelhana no contexto mundial,
sendo que o Castelhano falado na América Central e América Latina, tem inúmeras
variantes, consoante o País em que é falado.
Na realidade podemos especular se este acordo não visa apenas promover os
interesses editoriais e culturais do Brasil, sem levar em conta o interesse dos
outros países que compõe a CPLP.
Entre os vários argumentos que ouvi em defesa do Acordo, houve um que me
pareceu realmente caricato, isto para não usar um termo mais forte. Afirma-se
que o Acordo se destina a aproximar a escrita da oralidade, deixando caír as
consoantes mudas e alterando variadíssimas regras de acentuação e até de
pontuação. Ora isto jamais evitará que os Portugueses continuem a dizer “cómico”
e os Brasileiros “cômico”, não sendo nenhum “comico” que
resolverá esta diferença. Por outro lado, se este critério fosse realmente
decisivo, teríamos de arranjar grafias alternativas dentro do nosso próprio
País para diferenciar o nosso vernáculo “v” do “b” nortenho de acentuada
influência Galêga, ou o “não” do “nã” Alentejano.
Pois é! Se este fosse realmente um critério, mais tarde ou mais cedo estaríamos
a escrever “deiam” em vez de “dêm”, ou “hádem” em vez de “hão-de”,
como o fez Jorge Coelho certa vez, que em pleno comicio do Partido Socialista, perante as televisões e
rádios nacionais, gritava a plenos pulmões :”Eles hadem de ver!”
Não sou político, não sou filólogo ou linguísta, tambem não sou académico, por
isso as minhas atitudes terão sempre pouco peso, mas uma coisa garanto, é que
após a aprovação do Acordo Ortográfico, passarei a escrever - e talvez a falar - patrióticamente mal a
lingua Portuguesa!
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