terça-feira, 25 de setembro de 2012

MAIS RECORDAÇÕES DO MEU PAI – A PISCINA.


Um dia o meu Pai levantou-se mais cedo, e de fita métrica em punho desatou a tirar medidas a uma parte lateral do nosso jardim que já quase confinava com as dunas da praia.
Mediu, tornou a medir, fez umas marcações no chão e virando-se para nós que o observávamos com expectativa, anunciou com a pompa que lhe era peculiar: "Vou construir uma piscina!"
A obra lá começou. Para além do facto de não existirem as máquinas de hoje em dia, o acesso aquele canto do jardim era complicadíssimo, já que para um dos lados tinha umas escadas, e para o outro uma estreitíssima cancela que dava passagem para as dunas, isto tudo entalado entre a parede da casa e o muro do jardim. Os homens afadigavam-se com pás, enxadas e carrinhos de mão, cavando naquela areia que insistia em escorrer para dentro da cova já aberta. Sobre a supervisão autoritária do meu Pai, a cova lá foi crescendo, de tal maneira que já tinha quase o dobro do tamanho da planeada piscina. Depois,  lá se conseguiu montar uma cofragem e começou-se a construir aquele grande tanque com cimento ao qual tinha sido adicionado um pigmento amarelo-mostarda (?), de modo a que a piscina tivesse a cor por ele idealizada.
Finalmente um dia ficou pronta: Um tanque de cimento amarelo-mostarda, com quatro metros por dois, uma profundidade de um metro e meio e umas escadinhas a um dos topos.
Canalização não existia! Também, para quê? "Skimers", filtros, motores eléctricos, etc... Eram coisas que, além de estarem pouco divulgadas na época, foram olimpicamente ignoradas, já que o seu custo inviabilizaria a nossa piscina.
Demorou cerca de dois dias a ser enchida com uma mangueira e finalmente ficou pronta para uso.
Foi uma festa! Todos demos mergulhos, chapinhámos e brincámos enquanto o meu Pai anunciava enfáticamente que o almoço iria ser servido na piscina.
Passados três ou quatro dias a água começou a adquirir um suspeitíssimo tom esverdeado, tornando-se pouco convidativa. "São só micro algas. Não tem perigo nenhum!" Opinava o meu Pai, que na altura já era o único a mergulhar naquelas águas sombrias. Mais algum tempo passou, e a água, de esverdeada passou a negra. Pouco tempo depois já se divisavam naquelas águas paradas, as primeiras larvas de mosquito.
"Tem de se mudar a água." Dizia ele, puxando pela cabeça, pois sabia perfeitamente que não tinha sido instalado nenhum ralo no fundo.
Um dia chegou a conta da água e olhos quase lhe saltaram das órbitas quando se apercebeu quanto iria pagar por ter enchido a piscina uma só vez.
A partir desse momento, a piscina morreu!
Mais ninguém pensou nela até ao dia em que a água começou a cheirar realmente mal e os mosquitos tornaram as noites insuportáveis. Lá se chamaram os bombeiros que com uma bomba motorizada esvaziaram de vez a nossa mal sucedida piscina.
Parecia o fim da história, mas com a chegada do inverno, as águas das chuvas acumulavam-se-lhe no fundo e o ciclo de incómodos recomeçava. Então lá vieram os homens outra vez, não para arranjar a piscina, mas sim para a encher de areia até à borda.
Durante algum tempo a única coisa que dela se divisava, era a borda amarelo-mostarda, ligeiramente boleada que assomava da areia. Depois, com as nortadas violentas de Março, até isso as areias das dunas acabaram por cobrir.
Há muito que não passo sequer perto dessa casa e nem sei se ela ainda existe, mas em caso afirmativo, pergunto-me com alguma curiosidade se os actuais residentes suspeitarão que têm uma piscina sepultada no jardim.
E era assim o meu Pai... 

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