quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

OS MIRONES DE MIRÓ

Com inexcedível zêlo, Portugal e os Portugueses mais uma vez patentearam ao mundo o seu provincianismo e o paroquialismo que tolhe o país e de que enfermam as suas instituíções.
O momentoso caso da colecção dos quadros de Joan Miró, parte da massa falida do extinto BPN, teve o condão de trazer ao de cima todas as idiotices e incompetências nacionais.
Segundo notícia publicada hoje no jornal Público, à data de 2006 o BPN possuía uma colecção de cerca de duzentos quadros de Miró. Ora a ser assim, o que se impõe perguntar é o que terá acontecido aos restantes 115 quadros, se de facto estes 85 que estão na berlinda tão importantes são para a cultura nacional, o que terá sucedido aos outros de que nunca se ouviu falar. Por outro lado, se estes quadros passaram para a mão do Estado aquando a nacionalização do BPN, porque só agora, ao fim destes anos todos se levanta este clamôr de indignação e este clima de polémica, àquilo que aparentemente não passaria de um avisado acto de gestão.
Segundo nos é dado a saber, estes quadros transitaram para a propriedade da Parvalorem e Parups, empresas criadas com o único objectivo de recuperar créditos do BPN, que com a sua venda pretendiam assim minimizar os prejuízos, que mercê o atabalhoado e mal conduzido processo de nacionalização do banco, fatalmente recaírá sobre os contribuintes.
Em primeiro lugar há que interrogar os responsáveis pelo Ex-Ministério da Cultura do último Governo Socialista, porque é que a colecção, aparentemente tão vital à cultura dos Portugueses, esteve estes anos todos encerrada nos cofres da CGD. Se este património era tão valioso, inclusivamente para o turismo cultural, que fazia ele escondido na ecuridão das profundezas da caixa forte da CGD?
Como tem sido habitual, a oposição nacional, também ela serôdia e paroquial, começou por transformar um normal acto de boa gestão, num caso judicial – o que já vem sendo hábito – e finalmente tornou-o num enorme imbróglio político, lançando uma enorme questão na Sociedade Portuguesa, discutida nas redes sociais, jornais e programas de rádio e televisão, nos quais todos se sentem autorizados a dar uma opinião. Assim chegamos ao ridículo de ouvir naqueles programas de tv e de rádio, que têm a participação dos telespectadores ou ouvintes, motoristas de táxi, domésticas Alentejanas ou agricultores Minhotos, expenderem as mais doutas opiniões sobre o destino a dar à colecção do falecido BPN, sendo que provávelmente ignoram sobre o que está a falar, sem saber quem foi Joan Miró ou mesmo sem serem capazes de reconhecer uma obra do pintôr, nem que lha esfregassem na cara.
Realmente, toda esta situação não deixa de ser tão surrealista, que de longe abafa o surrealismo do pintor Catalão.
Uma empresa pública de direito privado, a Parvalorem, pretende abater um passivo monumental. Rápidamente é movida uma providencia cautelar para o impedir e que não é aceite pelo tribunal. Mas as juíza, como a maior parte dos nossos magistrados quis ir mais longe, e em vez de se ater à providência cautelar sobre a venda deste espólio, questionou a legalidade da saída das obras, algo que não lhe tinha sido perguntado. A partir daí, começou o pandemónio, com opiniões de tudo e de todos, incluíndo a “abalizada” opinião do Comendador Berardo, que muito gostaria de juntar esta colecção áquela que alugou ao Estado Português, num estranhíssimo contrato de comodato, que nos tem custado os olhos da cara.
Por outro lado, não estando classificada pela Direcção Geral do Património Cultural, custa muito entender este burburinho, já que o artigo 68º da Lei de Bases do Património Cultural diz que “salvo o acordo do proprietário, é vedada a classificação como de interesse nacional ou de interesse público do bem, nos dez anos seguintes à sua importação ou admissão”. Mediante isto, está bom de ver que nada impediria uma venda de legal dos quadros e tudo o que se tem dito e afirmado sobre o assunto, não passa de fogo de vista político e da habitual demagogia.
Enfim, nada poderia ser mais ridículo!
Aos tais taxistas, domésticas e outros intervenientes populares que acham criminoso vender a colecção Miró, seria bom perguntar-lhes se concordariam, na actual situação, em agravar os seus impostos se o Governo decidisse comprar, por exemplo, uma colecção de Picassos ou Dalis. É claro que não concordariam, e logo viria a lamúria dos sacrifícios impostos aos Portugueses e do seu empobrecimento colectivo, mas a verdade é que essa hipotética compra, teria rigorosamente o mesmo efeito do que terá a não venda da colecção Miró.
Após este espectáculo pouco dignificante, a Sociedade Portuguesa em geral e a classe política em particular, deram ao mundo uma imagem da sua verdadeira natureza: No fundo não passam todos de uns mirones de Miró, saloios, provincianos e ignorantes.




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