Já no Sec. III, Servius Sulpicius Galba reportava para Roma,
que na Lusitânia, existia um povo que não se governava nem se deixava governar.
Dezoito séculos depois, há que admirar a capacidade de
observação e lucidez deste General Romano, pois na realidade, durante este
largo espaço de tempo, pouco ou nada mudou nas mentalidades e indiosicracias do
povo Luso.
É realmente extraordinário, e há que reconhecer méritos,
pensar que existe alguém neste jardim à beira-mar plantado que pense ser
possível governar esta gente, que para além dos proverbiais níveis de
ignorância e iletracia, acha-se sempre coberta de razão.
Como governar um País, no qual se supõe existir uma
democracia representativa, quando as decisões políticas, tomadas na
legitimidade dos mandatos populares, é semprte – ou quase sempre – contestada,
e desagua numa torrente de providências cautelares, que em última análise irão
ser apreciadas por juízes, ou juízas, de competência discutível e de imparcialidade
duvidosa?
O último exemplo, e por sinal paridgmático, é a aprovação em
Conselho de Ministros do novo mapa judiciário.
Há anos que é discutida a necessidade de ajustar o referido
mapa às condições demográficas do País, mas no momento da decisão, logo se
levanta um clamôr indignado sobre as decisões tomadas.
A federação das corporações em que estão inseridos os agentes
judiciais, desde juízes, magistrados, advogados, sindicatos de oficiais de
justiça – e desconhecemos a posição dos porteiros e das mulheres da limpeza – abespinham-se
em relação a uma reforma, que o mais simples bom senso reputa de fundamental.
Ao que parece, serão encerrados 20 tribunais e outros 27
serão transformados em balcões de proximidade. Chega a ser penoso ouvir um Juíz
Conselheiro, como Rui Rangel, referir que um balcão de proximidade não tem a
diginidade suficiente para lidar com um processo. Será mais digno observar o
penoso rastejar da justiça que se mostra incapaz de resolver de forma expedita e
eficiente os casos mais mediáticos e que envolvem gente importante?
Depois surge aprumado o provincianismo autárquico!
Presidentes de Câmaras Municipais com comarcas que gerem
pouquíssimos processos, acusam o Governo de desertificar o interior do país,
quando o encerramento dos tribunais resulta dessa desertificação e não o
contrário. Certos autarcas expendem por vezes justificações espantosas, tais
como, por exemplo, afirmar de que a economia local sofrerá grandes danos, pois
cafés e restaurantes da zona sobrevivem à custa do movimento judicial. A
pergunta que se impõe, é saber se será obrigação dos contribuintes, a
viabilização do pequeno comércio e a restauração nessas localidades, dando-lhes
através de um tribunal, o movimento comercial que doutra forma não teriam.
Bem vistas as coisas, é completamente caricato!
A justiça, através dos seus agentes, deveria ser o garante
da democracia e da equidade na Sociedade Portuguesa. Uma institução que a todos
deveria proteger, ou punir, de forma expedita, rápida e equitativa.
Infelizmente não é isso que se passa. Bem podem clamar juízes, magistrados e
advogados, que a justiça é bem mais eficiente do que a percepção que dela têm
os cidadãos, mas esquecem que essa percepção é muito mais importante para a
sociedade do que aspectos técnicos, burocráticos e obscuros, atrás dos quais
são exímios a se dissimularem.
Infelizmente para a nossa Sociedade, a justiça que temos, de
cariz Napoleónico, estagnou em meados do Sec. XIX e assim se tem arrastado até
princípios do Sec. XXI. Burocrática, cinzenta, estúpidamente formal, senhora de
um jargão quase incompreensível para o comum dos mortais, esconde-se atrás de
rituais anacrónicos para negar aos cidadãos a explicação lógica do seu
funcionamento.
Bastou a lei ser aprovada em Conselho de Ministros, para
logo choverem providências cautelares, intrepostas por autarcas despeitados.
Estas providências cautelares irão ser apreciadas por juízes que inevitávelmente
serão partes interessadas no assunto, quando não com inclinações ou ambições
políticas não confessadas. Definitivamente Portugal caíu na grande armadilha
que é a judicialização da política, fazendo desta uma mera leitura da lei e
impedindo-a de fazer aquilo que à política está destinado: Escolhas e opções de
políticas e modêlos.
E assim, a juntar à praga em que se tornou a funcionalização
do pessoal político/partidário, que hoje em dia pouco difere de uma burocrática
repartição pública, temos agora as decisões políticas observadas à luz de um
código civil e administrativo que não foi elaborado para prrencher estas
funções.
Ao cabo destes dezoito séculos, apenas nos resta prestar
tributo a Servius Sulpicius Galba, que mercê a sua cultura e inteligência,
definiu em duas penadas as características de um povo capaz da proeza de não
ser capaz de evoluir, nem sequer depois de tantos séculos.
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