terça-feira, 1 de outubro de 2013

O DIREITO DE NÃO VOTAR!

No rescaldo das recentes eleições autárquicas, uma grande confusão foi estabelecida em relação aos votos em branco, votos nulos e à abstenção.
 
Afirmou-se por aí, a torto e a direito, que o acto de votar consistia num dever cívico, derivado de um direito conquistado, sendo que qualquer abstencionista passou a ser considerado um transfuga do sistema, possuidor de pouca cultura democrática e menorizado na sua capacidade de criticar o sistema, pelo facto de não ter participado nesta farsa eleitoral.
Só quem quem sofre de profunda iletracia política, ou é prêsa de outros interesses, pode defender semelhante posição, esquecendo a forma de como o sistema se defende a si próprio, sem qualquer respeito pela vontade popular.
Em 2005, todos os partidos, sem excepção, votaram a favor da alteração constitucional, alterando assim a leitura de protesto do voto em branco e dando-lhe o mesmo valor do voto nulo. Em suma, votar em branco ou nulo é não saber  votar... no entanto presiste a convicção de que o voto em branco continua a ser um voto de protesto, não havendo por parte de TODA a classe política, qualquer vontade de esclarecer este assunto.
Assim, um protesto efectivo, representado pela abstenção, votos brancos e nulos ficou reduzido ao valor da abstenção, 47,36%, quando na realidade, se se somarem os votos brancos e nulos, ter-se-ia uma percentagem de 54,17%, o que mostra bem a falta de capacidade mobilizadora dos sectores políticos em Portugal. Ainda seria possível  juntar  os 6,66% que votaram nos independentes, e assim seria atingida uma percentagem de 60,83% de recusa no chamado voto partidário.
Como afirmou no Porto Rui Moreira, se os partidos não perceberam o que se passou no Porto (e ao que parece não perceberam mesmo!), então nunca perceberão o que se está a passar no país!
Assim, e tendo sido demonstrado que a abstenção tem o mesmíssimo valor do voto branco ou nulo, para quê saír de casa para exercer aquilo a que uns chamam direito e outros chamam dever? Além de inútil, a verdade é que o voto em branco, não o nulo, representa proventos para os partidos, dado que são atribuídos proporcionalmente a cada força política, em função dos seus resultados efectivos, com a respectiva compensação por parte do Orçamento de Estado.
É bom que os Portugueses sejam desenganados! Ao votarem em branco, estão a financiar os partidos, que aparentemente pretendem penalizar...
Por isso, mais do que criticar a abstenção deliberada, os Portugueses deveriam entender que essa é de facto a única forma de demonstrar o seu descontentamento em relação a este sistema “sistema” que se auto-protege e se arroga o direito de fazer ínvias leituras políticas sobre os valôres da abstenção, atrevendo-se até a menorizar as vitórias dos chamados “independentes”.
Por outro lado, a “ditadura” partidária, com a maior das prepotencias, avança com listas de “compadres”, ignorando completamente os interesses do seu eleitorado e a seguir, vem afirmar que quem não votou, não tem direito a pronunciar-se sobre os resultados.
Uma redonda mentira!
Se alguém for posto perante uma escolha impossível, tem todo o direito de não escolher, sem que no entanto perca qualquer direito a opinar sobre o assunto.
E assim, cá vamos cantando e rindo, clamando vitórias ou derrotas eleitorais, que mais não correspondem a cerca de 40% dos votos, já que o significado político dos outros 60% foi deliberadamente esvaziado de sentido e significado, sem que essa circunstância apague o direito à indignação de quem não se revê no sistema.
Em virtude destas considerações, e levando em conta que o sistema se auto-preserva sem qualquer escrúpulo ou respeito por quem dele discorda, parece da mais elementar justiça de que alguns cidadãos se orgulhem do direito de não votar.
Na realidade, parece haver uma verdade há muito esquecida: A política existe para servir os cidadãos e não são os cidadãos que devem servir a política!