segunda-feira, 5 de novembro de 2012

SOB A TUTELA DO MEDO.



Quando era pequeno, lembro-me de me assustarem dizendo: “Se não come a sopa toda, chamo o polícia!”.
Não sei o que teria de assutadora, a figura gorda e cheia de bonomia, que regularmente patrulhava a nossa rua. Era um homem grande, que vestia uma farda de coçado cotim, com uma considerável concentração de gordura na zona da nuca, cujas calças largueironas eram presas por um largo cinturão, do qual sobressaía o coldre da pistola e pendia um ameaçador bastão.
Na realidade, por pouco assustador que o guarda de giro fosse, a verdade é que eu, mediante a ameaça, comia a sopinha toda e não refilava. Pelos vistos, o medo fazia o seu caminho e sobrepunha-se à minha falta de vontade de comer a mistela a que chamavam de sopa.
De facto, o medo sempre constituiu uma arma poderosa, que consolidou reinados, que impôs morais e que sempre constituiu uma poderosa arma política, que se bem utilizada, funciona com uma enorme eficiência. Na sua obra prima “O Principe”, já Nicolau Maquiavel dizia que a um soberano servia mais ser temido do que amado. Esta é realmente a verdadeira e sinistra dimensão política do medo.
Hoje em dia, nos tempos conturbados que atravessamos, somos regular e presistentemente ameaçados com a saída do Euro, e o alegadamente desastroso regresso ao Escudo.
Na verdade, vão aparecendo estudos e planos que não confirmam nem preconizam um desastre de grandes dimensões para essa eventualidade. Um regresso programado e bem organizado à moeda nacional para transacções internas e a constituição de reservas de divisas fortes para as transacções internacionais, não só se apresenta viável, como até recomendável.
Com soberania sobre a nossa moeda, poderíamos desvalorizá-la com cautela, de modo a controlar a recuperação da economia sem o desastre social, económico e financeiro que nos está, e continuará por largo tempo, a ser imposto.
Então porquê assustar as populações? Porquê instalar um medo quase irracional e apresentar como tragédia o retorno à moeda nacional, mesmo sabendo todos no intímo que mais tarde ou mais cedo será inevitável acontecer? A quem aproveita este culto do medo do regresso ao Escudo?
Em primeiro lugar não podemos esquecer que de há umas décadas para cá, vivemos sob a tutela de poderes políticos totalmente capturados pelo poder financeiro, e este último só tem a ganhar com a situação vigente.
Os políticos, ao serviço do poder financeiro, através da forma como se foram endividando e hipotecando os seus Países, pensam com temor na quantidade de vantagens, poder, previlégios e mordomias que perderiam se não zelassem pelos superiores interesses de quem os tutela. A Banca, é claro, seria confrontada com um esquema cambial que em nada beneficiaria as pouco claras transacções e aplicações dos tais “produtos complexos”, acerca dos quais, nem mesmo eles entendem totalmente o funcionamento.
No fundo, como o padrão da moeda passou a ser a dimensão da dívida, confrontamo-nos com o paradoxo de que quem é mais rico é quem mais hipóteses tem de se endividar. O dinheiro deixou de ser um meio de pagamento, e passou ele próprio a ser uma simples mercadoria.
Estando Portugal inserido numa zona monetária, constituída por Paises com economias de sustentabilidade completamente diversa, pouco interessará às economias mais poderosas a recuperação das mais debilitadas, pois a situação actual dá-lhes competitividade à moeda, beneficiando da fraqueza dos mais pobres, mas que apesar de tudo constituem mercados de consumidores, que assim podem ser controlados pelas economias mais fortes. Lembrem-se das tremendas pressões de que Portugal foi vítima por parte do Governo Alemão, aquando a privatização da EDP, e que só não conseguiu os seus intentos porque os Chineses puseram a fasquia tão alta, que nem a Alemanha lá pôde chegar.
A tentativa de Germanização das economias da Europa do Sul, controlando intolerávelmente os custos do trabalho e do consumo interno, aliada aos movimentos políticos tendentes a modernizar a industria Rússa, dariam finalmente à Alemanha aquilo que ela não conseguiu por via das armas: Uma hegemonia Europeia de grande alcance político e económico e cuja arma utilizada, mais não é do que o Euro.
Não nos deixemos portanto sucumbir ao medo que nos está premeditadamente a ser instilado, com inconfessáveis e sinistros objectivos políticos.
Defendamos pois o regresso à soberania da nossa moeda e denunciemos as miseráveis manobras que estão sendo levadas a cabo, amedrontando e mentindo às populações, omitindo e falseando as opiniões e os estudos de reputados economistas, divulgando apenas o trabalho de gente que já está total e completamente capturada pelo poder financeiro e que nada está preocupada com o bem estar das Sociedades..