sexta-feira, 25 de maio de 2012

AS VERDADES DE CADA UM

Aqui há tempos, no velório de uma pessoa amiga, encontrei um velho conhecido, engenheiro e físico, que trabalha no Laboratório Nacional de Engenharia Nuclear.
Trata-se de um homem interessante, de conversa fácil e fluída, com aquele tipo de espírito curioso que permite conversas mais densas e cerradas, hoje difíceis de manter no limitado universo de pessoas que nos cercam.
Veio a talho de foice, talvez por estarmos num velório, a questão da alma, da vida após a morte e fatalmente a conversa desaguou num tema teológico, no qual se punha a questão suprema: A existência, ou não existência de Deus.
A conversa animou-se, e eu, presa de todas as minhas dúvidas, argumentava que no limite não se conseguiria de forma nenhuma negar a sua existência, e parafraseava o meu Pai, portador de dúvidas iguais às minhas, que afirmava que a probabilidade do Universo, em toda a sua perfeição, ser obra o acaso, era a mesma que lançar ao ar um pacote de massa "sopa de letras" e cair no chão um dicionário já pronto.
Por seu lado, o meu amigo, usando toda a sua argumentação científica, afirmava que nos aceleradores de partículas já se conseguiam recriar os instantes precedentes ao "Big Bang" e nada provava qualquer interferência ou manipulação da energia e da matéria, para além do que aquilo que era matemáticamente previsível.
Com o decorrer da discussão, interroguei-o como é que ele aceitava fácilmente a premissa de que um electrão podia coexistir simultâneamente em dois locais diferentes, e lhe era tão difícil acreditar num Plano superior que comandasse o Universo, tivesse esse Plano o nome que tivesse.
A resposta fascinou-me! Com a maior das calmas, afirmou ele que isso era algo que tinha lógica perfeita no universo das partículas sub-atómicas.
Não me senti com vontade de prosseguir a conversa.
De facto, aquilo que para ele tinha lógica no microcosmos que ele aparentemente tão bem conhecia, consistia para mim num mistério tão absoluto, como o da própria existência de Deus.
Na realidade, todos os dogmas são por natureza impossíveis de explicar, e cada um acredita nos seus. Para alguns Deus existe e comanda a toda nossa existência, para outros, uma minúscula partícula eléctricamente carregada pode estar em dois lugares ao mesmo tempo...
Afinal, discutir para quê?

1 comentário:

Anónimo disse...

Muito bom! E adorei a metáfora da sopa de letras; acho que vou usá-la muita vez :-)

Beijinhos,
Madalena Vidal